Continuando a parte 1 deste post, vamos comentar as duas últimas entrevistas realizadas por Guy Raz.
Como a adversidade afeta a felicidade no longo prazo?
Dan Gilbert, como já vimos na parte 1, é um psicólogo da Harvard University, que estuda a felicidade e que, nesta entrevista, discute como o infortúnio afeta a nossa felicidade no longo prazo.
Ele inicia a sua apresentação dizendo que, na evolução da espécie humana, o que nos distinguiu dos nossos antecessores foi a presença, em nosso cérebro, de uma estrutura até então inexistente, chamada de córtex pré-frontal. Nos últimos 2 milhões de anos, o peso cerebral triplicou, em grande parte pelo aparecimento do córtex pré-frontal. Esta parte de nosso cérebro funciona, entre outras coisas, como um simulador de experiências, que nos permite imaginar qualquer coisa, antes de coloca-la em prática.
E esta capacidade nos trouxe, de cima das árvores, para os “shopping centers” da atualidade. Todavia, de acordo com estudos realizados, esta função parece ter um viés de impacto, que a faz funcionar mal. Em outras palavras, o simulador nos faz acreditar que os resultados das experiências são piores do que acontece, na realidade.
Fatos como ganhar ou perder uma eleição, ganhar ou perder um parceiro amoroso (namorada, esposa, amante, de qualquer sexo), receber ou não uma promoção, passar ou não num exame, têm um impacto bem menor, em termos de intensidade e de duração, do que imaginamos. De fato, um determinado evento, depois de algum tempo, como uns três meses, acaba tendo um impacto muito menor que o inicialmente imaginado. Nós somos muito mais flexíveis que imaginamos e somos capazes de voltar às condições basais e recomeçar.
É interessante verificar como a grande maioria das pessoas que passou por experiências muito dolorosas, como perder um filho, perder o emprego, ou mesmo a visão, depois de dois ou três anos se recuperaram e estão muito bem. Pode haver duas causas para que isto aconteça: em primeiro lugar, porque este processo é invisível e, em segundo lugar, porque psicólogos e filósofos acreditam que é importante não saber que temos esta capacidade.
Parece que nós, os seres humanos, temos uma espécie de sistema imunológico psicológico, principalmente inconsciente, que nos permite sintetizar a felicidade, isto é, mudar a imagem do mundo em que vivemos e que nos faz nos sentirmos melhor sobre ele. Esta capacidade nos faz reformular eventos em nossa mente.
Dan Gilbert cita então três exemplos: um político importante, que errou e perdeu o cargo, dinheiro, prestígio, enfim, quase tudo; uma pessoa que passou mais de 30 anos numa prisão, por um crime que não cometeu e que, finalmente, inocentada por um teste de DNA, foi libertada aos 78 anos de idade; e um antigo baterista dos Beatles (famoso conjunto musical inglês), que foi substituído por Ringo Starr. Essas três pessoas foram entrevistadas anos mais tarde e disseram estar muito bem e felizes.
Gilbert diz que nós somos, em parte, responsáveis pela nossa própria felicidade. Que nós temos algum controle sobre ela, mas não o controle total.
O impacto da felicidade ou da infelicidade causada por determinados eventos, como ganhar na loteria, ficar cego, etc., é relativamente muito grande no início e relativamente pequena a seguir, e isto tem a ver como nós emolduramos os eventos. Nós podemos aprender a interpretar eventos de maneira positiva.
Isto está relacionado, de alguma forma, à natureza da felicidade, que é uma emoção, um sentimento, e ao fato de o nosso cérebro não estar preparado para sustentar um determinado sentimento por um longo período de tempo.
Gilbert conclui que é claro que existem coisas boas e ruins e que nós fazemos escolhas que nos fazem mais ou menos felizes.
O que é preciso para sentir gratidão?
David Steindl-Rast é um monge beneditino, que vive no estado de New York, e ele pergunta qual será a conexão existente entre a felicidade e a gratidão?
Segundo ele, não é a felicidade que leva à gratidão, mas o contrário, isto é, a gratidão nos traz felicidade. E para que a gratidão aconteça, duas condições são necessárias: uma é o valor de alguma coisa, e a outra é que essa coisa seja um dom, algo que nos foi dado e não conquistado, ou comprado.
Para David, cada momento que vivemos é uma oportunidade que nos foi dada e que voltará a se repetir, isto é, novas oportunidades surgirão. Isto quer dizer que devemos sentir gratidão por tudo? É claro que não; nós não nos sentiremos felizes na vigência de violência, de guerras, de opressão, de exploração. Todavia, devemos sentir gratidão pelos novos momentos que surgirão e pela oportunidade de aprendermos algo que nos possibilitará construir uma boa vida, cheia de felicidade.
E qual será um método que nos possibilite nos enchermos de gratidão: é como aprendemos, quando crianças, a atravessar uma rua: pare, olhe e vá.
Eu mesmo, aos 76 anos de idade, já pensei algumas vezes em quantas coisas, quantos eventos, totalmente independentes da nossa vontade e do nosso controle poderiam ter interrompido a minha vida: um acidente, uma doença, uma catástrofe. E, simplesmente pelo fato de ainda estar vivo, ser capaz de escrever, de andar, de amar, de ainda aprender coisas novas, eu sou grato.
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